Tenho lido nas redes sociais comparações do eurodeputado do PSD Paulo Rangel com o traidor ao serviço de Espanha, Miguel de Vasconcelos.
É evidente que se Vasconcelos defendia a dinastia dos Filipes que lhe deu honras, mordomias e o cargo de régio secretário de Castela, estava exposto ao preço pago pelos infames da pátria, na sequência do desrespeito de todas as promessas feitas por Filipe IIº de Espanha, Iº de Portugal e pelos outros dois que lhe sucederam. Outrotanto não acontece com Rangel.
Recorde-se que a crise da sucessão se instalou com o desaparecimento de D. Sebastião, em Alcácer Quibir. Os “primos” de Castela acederam ao trono por invocada legitimidade de parentesco directo. De 1580 a 1640 procederam a castelhanização de Portugal esquecendo os juramentos de zelo sobre os interesses do país, seus usos, costumes e tradições, criando assim uma onda profunda de descontentamento entre a nobreza, a alta burguesia lusitana e algum povo mais esclarecido.
No dia 1 de Dezembro de 1640 o Terreiro do Paço, onde estava instalada a regente espanhola duquesa de Mântua mais seu fiel secretário Miguel de Vasconcelos, foi tomado por 40 fidalgos portugueses que arrancaram o traidor do armário onde se escondera, o defenestraram e proclamaram da varanda, num acto que perduraria séculos fora, o novo rei, D. João IV, duque de Bragança.
A raiva contra Vasconcelos foi tamanha que, após ser atirado pela janela ao terreiro, os populares e demais nobres o arrastaram preso a cavalos pelas ruas de Lisboa, como exemplo e vil castigo, desfazendo-o em pedaços que depois deram de comer aos esfomeados rafeiros da capital, que não se fizeram rogados.
Por isso, acho exagerada esta comparação do eurodeputado Rangel — por mais mal que ele deseje ao seu país e aos portugueses — com o defenestrado Miguel.
Afinal Rangel só quer mais austeridade, mais desgraça para os depauperados conterrâneos e mais riqueza para os já muito ricos que defende com o fervor neo-liberal da social-democracia de seu amo, Passos Coelho, que talvez por ter gostado muito do que fez e das mordomias que usufruiu, deseje a todo transe voltar a ser primeiro-ministro de Portugal… “só não sabe é quando.”
Com esse fito, os seus sicários, rebolam-se na lama, em Bruxelas e em Lisboa, a favor da reprovação do Orçamento do Estado proposto pelo actual governo.
A comunicação social, salvo honrosas excepções, fazendo eco das vozes dos donos, desempenha com rigor e brio o seu papel de carpideira da desgraça.
Quanto a Rangel, ele nunca deveria ser arrastado por cavalos nem comido por cães vadios. O que é de mais também é moléstia e Portugal tem nos seus brandos costumes muitos pergaminhos do seu tolerante ex-libris.